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COP25 e o Pacto Ecológico Europeu

Atualizado: 13 de jan. de 2020

Por entre Conferências e Pactos, “o maior perigo que enfrentamos é quando os políticos e os emissores de CO2 nos fazem acreditar que algo está a ser feito, quando nada está a acontecer”.


Fotografia: Reuters

A Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP 25) em Madrid terminou este domingo, dois dias depois do previsto, com consenso relativo à maioria dos temas em negociação. No entanto, o que era para muitos o ponto central da cimeira, a regulamentação do Artigo 6 do Acordo de Paris, ficou sem solução e foi adiado para a próxima cimeira, em Glasgow

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Esta Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas de 2019 foi a 25ª Conferência das Nações Unidas sobre as alterações climáticas. Integradas nesta COP25 estiveram a 25ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (UNFCCC), a 15ª reunião das partes do Protocolo de Quioto (CMP15) e a segunda reunião das partes do Acordo de Paris (CMA2).



Problemas ainda antes de começar


A organização da COP25 esteve inicialmente nas mãos do Brasil. No entanto, em novembro do ano passado Jair Bolsonaro, o Presidente do país, anunciou que não poderia receber o evento, alegando razões económicas. Bolsonaro é, sem segredo nenhum, um dos maiores críticos do Acordo de Paris sobre Ação Climática de 2015.


Assim, o Chile ofereceu-se para ser o novo anfitrião. Mas a situação no Chile também não estava favorável à realização da Conferência. O passado mês de outubro foi um dos mais atribulados dos últimos tempos, com protestos a abalar violentamente o país – os mais intensos desde o início do período democrático que se seguiu à queda da ditadura de Pinochet nos anos 90. As centenas de milhares de chilenos a marchar nas ruas e os milhares de detidos e de feridos, são a razão, assim, do cancelamento da cimeira.


O Chile ia ser, também, o anfitrião da APEC, a cimeira da Cooperação Económica Ásia-Pacífico. Dado o estado de emergência imposto na nação sul-americana, o Presidente Sebastián Piñera foi obrigado a anunciar a 30 de outubro a retirada do país da organização dos eventos. Nas palavras de Piñera, foi “uma decisão muito difícil e que nos causa muita dor. Entendemos perfeitamente a importância da APEC e da COP para o Chile e para o mundo, mas baseámos a nossa decisão no bom senso”.


Dois dias depois, a agência da ONU sobre Mudanças Climáticas anunciou a realização da COP25, por fim, em Madrid, com início marcado para 2 de dezembro.



Emergência climática declarada pelo Parlamento Europeu


A 28 de novembro, o Parlamento Europeu declarou uma situação de emergência climática e ambiental. Foi rejeitada, assim, a proposta do Partido Popular Europeu para que a expressão “urgência climática” passasse a ser usada. Foi igualmente votada uma resolução sobre a COP25. Apesar de declaração ser um ato quase meramente simbólico, a resolução apelou à aplicação de medidas concretas. A mensagem ficou, assim, entregue à comissão presidida por Ursula von der Leyen.


Entre os objetivos presentes no green deal tão anunciado, deverá estar incluída a redução “em 55% das emissões de GEE [gases com efeito de estufa] a nível interno até 2030”, para que, dessa forma, seja possível atingir a neutralidade de emissões líquidas em 2050. No documento é pedido à comissão que avalie “exaustivamente o impacto climático e ambiental de todas as propostas legislativas e orçamentais relevantes”, mantendo em mente o “objetivo de limitar o aquecimento global a menos de 1,5ºC”.

Fotografia: Parlamento Europeu


A COP25 e as negociações


A 25ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas iniciou-se, assim, na manhã de 2 de dezembro. Um dos pontos centrais previstos para as negociações era o Artigo 6 do Acordo de Paris. Este artigo refere-se essencialmente aos mercados de carbono, definindo regras e outras formas de cooperação internacional. A necessidade da tomada de decisões politicamente difíceis levou a que as negociações já tivessem sido adiadas em Katowice, na Polónia, na COP24 de dezembro do ano passado.


Ursula von der Leyen foi aprovada no Parlamento Europeu como nova presidente da Comissão Europeia, tendo o executivo que encabeça iniciado funções a 1 de dezembro. Entre as promessas da alemã está uma “verdadeira transformação” para a Europa com base no green deal que defende. Este combate às alterações climáticas será a “estratégia para o crescimento” e desenvolvimento económico. O primeiro rascunho do Pacto Ecológico Verde foi apresentado internamente a 29 de novembro, tendo sido imediatamente criticado por não estar “à altura” das exigências. A Greenpeace declarou que o pacto terá “um impacto mínimo na atual situação de emergência climática”. A versão final do documento tinha apresentação final marcada para 11 de dezembro, prazo que, efetivamente, a Comissão cumpriu.


Mas, voltando ao início da COP25. A conferência arrancou envolta em boas intenções. O abandono do Acordo de Paris pelos EUA foi um dos fantasmas presentes, referido indiretamente logo pelo chefe do Governo espanhol. Pedro Sanchéz afirmou que “durante anos vivemos com o negacionismo climático. Hoje só um punhado de fanáticos nega a evidência. Não há muro suficientemente alto que proteja desta ameaça qualquer país, por mais alto que seja”.


As declarações de António Guterres foram uma constante ao longo das duas semanas da cimeira. Carregadas de urgência e alguma desilusão, as palavras do secretário-geral das Nações Unidas relembram que é necessária uma completa transformação no modo de vida. Nas suas palavras, “precisamos de uma mudança rápida e profunda no modo como fazemos negócios, como criamos energia, como construímos cidades, e como alimentamos o mundo. Se não mudarmos urgentemente o nosso modo de vida, pomos em risco a própria vida”.

Fotografia: UNFCCC

6 de dezembro ficou marcado pela Marcha pelo Clima protagonizada por milhares de jovens. A organização estima que mais de 500 mil pessoas tenham percorrido as ruas de Madrid. Esta Marcha contou com ativistas de todas as partes do mundo, com as ONG’s mais diversas, com representantes de povos indígenas, com figuras públicas e com os milhares de estudantes que, no fundo, são atualmente as fundações nas quais assenta esta luta global.


Greta Thunberg discursou mais uma vez, na primeira das suas várias participações ao longo dos dias da COP25. A jovem sueca lembrou que “a mudança não virá de quem está no poder, mas das massas, de nós. Somos nós que vamos trazer a mudança. As pessoas no poder precisam de nos seguir, nós é que estamos a mostrar o caminho. Eles precisam de assumir as suas responsabilidades e de fazer o trabalho deles. Porque os nossos líderes estão a trair-nos e não vamos continuar a deixar que o façam. Dizemos, chega, agora. E a mudança vem aí, queiram ou não. Porque não temos opção”.


Dentro de portas, as negociações foram decorrendo sob as críticas dos representantes das Organizações Não Governamentais e sob o olhar atento dos milhares reunidos no exterior. Bem vistas as coisas, foram as negociações mais longas que uma Conferência destas já teve; os dias marcados não foram suficientes e não se conseguiu chegar a acordo dentro do estipulado, tendo sido necessário estender as negociações pelo fim de semana dentro. Jennifer Morgan, responsável da Greenpeace, declarou num dos debates organizados pela ONU que participa nestas COP há 25 anos e nunca tinha visto “uma divisão entre o que se passa no interior e no exterior tão grande”, afirmando-se “zangada e cansada de ouvir os líderes e negociadores a falarem de tudo o que não podem fazer”.

Fotografia: UNFCCC

Duas semanas depois, a cimeira terminou envolta em deceção e desapontamento. Carolina Schmidt, a presidente chilena da COP25, reconheceu que, apesar de todo o trabalho desenvolvido e dos avanços conseguidos, teria sido muito mais importante “implementar um mercado de carbono robusto, com integridade ambiental, que considere as necessidades de cada um, com um fundo de adaptação de que tanto precisamos”. Neste discurso de encerramento, deixou bem claro que o que se conseguiu alcançar “não é suficiente”, que não ficou satisfeita e que as decisões não chegam para “alcançar com sentido de urgência a crise causadas pelos impactos climáticos”.


As ONG não se pouparam em críticas. “Traição”, “falhanço” e “balanço pouco positivo” foram algumas das expressões usadas. António Guterres partilhou na rede social Twitter o seu descontentamento. “Estou desapontado com os resultados da COP 25. A comunidade internacional perdeu uma oportunidade importante para mostrar maior ambição em mitigação, adaptação e financiamento para enfrentar a crise climática. Mas não podemos desistir, e não vamos desistir”, foram as palavras usadas pelo secretário-geral das Nações Unidas.



O Pacto Ecológico Europeu


A versão final do documento foi apresentada pela presidente da Comissão Europeia a 11 de dezembro. Este conjunto de iniciativas está previsto para ser posto em prática durante os próximos anos. A arquitetura deste Plano encabeçado por Ursula van der Leyen tem dez pilares como base para as 50 iniciativas propostas.


Na comunicação feita em Bruxelas pela Comissão ao Parlamento, ao Conselho e ao Comité Económico e Social Europeus e ao Comité das Regiões, foi afirmado que, “a cada ano que passa, a atmosfera fica mais quente e o clima muda um pouco mais. Dos oito milhões de espécies que habitam o planeta, um milhão corre o risco de extinção. As florestas e os oceanos estão a ser poluídos e destruídos”.


A Comissão apresenta, assim, o Pacto como “resposta a estes desafios. Trata-se de uma nova estratégia de crescimento que visa transformar a UE numa sociedade equitativa e próspera, dotada de uma economia moderna, eficiente na utilização dos recursos e competitiva, que, em 2050, tenha zero emissões líquidas de gases com efeito de estufa e em que o crescimento económico esteja dissociado da utilização dos recursos”.

As metas presentes no documento dividem-se, assim, por: “ambição em matéria de clima”; “energia limpa, acessível e segura”; “estratégia industrial para a economia circular e limpa”; “mobilidade sustentável e inteligente”; “ecologização da política agrícola comum/estratégia ‘do prado ao prato’”; “conservação e preservação da biodiversidade”; “rumo a uma ambição de poluição zero por um ambiente livre de substâncias tóxicas”; “integração da sustentabilidade em todas as políticas da UE”; “a UE enquanto líder mundial”; “trabalhar em conjunto – um pacto europeu para o clima”.


Todas as medidas e metas apresentadas ainda carecem de prazos ou orçamentos definidos, trabalho que a Comissão irá desenvolver ao longo do ano. Von der Leyen afirma que “a ciência nos diz que ainda podemos pôr termo a este flagelo, mas o tempo está a esgotar-se”, prometendo que “a nova Comissão Europeia não vai perder tempo”.



Futuro incerto

A União Europeia comprometeu-se com a neutralidade carbónica até 2050. 73 países anunciaram que vão apresentar um plano de ação climática melhorado. O Pacto Global da ONU anunciou que 177 empresas concordaram em estabelecer metas climáticas baseadas na ciência e que se comprometem com o limite da temperatura global até 1,5ºC.


O problema é que, como diz Greta Thunberg, estas metas pouco significam na perspetiva global. “A ciência diz que precisamos de estabilizar o clima e evitar reações em cadeia. Cada fração de grau importa. O maior perigo que enfrentamos é quando os políticos e os emissores de CO2 nos fazem acreditar que algo está a ser feito, quando nada está a acontecer, exceto contabilidade inteligente e relações públicas criativas”. Estas foram algumas das declarações da jovem num dos debates da COP25.


Sem acordo definitivo relativamente aos mercados de carbono, da COP24 se passou para a COP25, e da COP25 se passa para a COP26. Desta vez, a cidade escolhida é Glasgow, na Escócia. Agora, é esperar mais um ano.

Fotografia: UNFCCC

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