Crónica de uma morte anunciada antes do tempo
- Sofia Matos Silva
- 9 de jan. de 2020
- 3 min de leitura
Todas e cada uma das profissões existentes são importantes e merecem o seu próprio mérito.

Jornalismo. Uma profissão de essência nobre. Por vezes, pode não o ser, mas nada na vida é apenas uma coisa. Dar voz a quem não a tem. Porém, também a quem berra para ser ouvido.
Em tempos, a opinião pública pode ter considerado o jornalismo algo nobre. Hoje em dia, no entanto, a situação parece ser diferente. Há quem odeie os jornalistas e já quem os bajule, mas poucos os respeitam. É que já nem me refiro a gostar, simpatizar ou admirar. Apenas respeitar.
Os jornalistas são uns intrometidos, uns coscuvilheiros, uns stalkers. Os jornalistas gostam de atenção, gostam de fama e não têm escrúpulos quando se trata de a obter. Os jornalistas invadem a vida das pessoas - numa era em que tudo se partilha, mas cuidado com a proteção de dados. A sociedade esquece-se que, sem profissionais dedicados à informação rigorosa e verdadeira, viveríamos num mundo que não saberia distinguir o verdadeiro do falso. A anarquia da informação, o caos dos dados ambíguos.
Devem preferir, se calhar, que o seu conhecimento do mundo contemporâneo se baseie em partilhas nas redes sociais. Preferem viver na prisão dos 280 carateres - divisões que nem quatro paredes têm, apenas duas, com teto mas sem chão, cuja única decoração são posters dos filmes kkkkkk e lol e erros gramaticais. Preferem a ignorância, portanto.
No outro extremo, temos os lambe-botas. Os que entendem a função do jornalista, apenas na medida que lhe pode ser útil. Ou seja, também não respeitam a profissão. Porque o que querem vai contra tudo o que o jornalismo representa. Querem promoção, destaque e tempo de antena. Esquecem-se que a fama deveria vir de conquistas que, de alguma maneira, contribuem para a evolução da Humanidade, e não de sorrisos bonitos que gostam de levar com os flashes das câmaras.
Enquanto estudantes de jornalismo, a situação é ainda mais estranha. Não representamos nenhuma entidade que justifique a bajulação, não fizemos nada ainda que justifique o ódio. Estamos presos num limbo. E somos olhados com desdém e narizes torcidos, aquele olhar que só os adultos sabem fazer de “olha mais um para o desemprego”.
Não há nenhum estudante de jornalismo que não tenha ouvido pelo menos uma vez - de familiares, de amigos dos pais ou de pais dos amigos - “vais para a CMTV?”. E uma vez é um eufemismo; mais preciso seria dizer uma vez por mês. Porque parece que agora isso é tudo o que as pessoas vêm. O jornalismo mediático. Aqueles “última hora” vermelhos em letras garrafais, que não aquecem nem arrefecem o sentido global das coisas. O anti jornalismo.
É bastante difícil lutar por algo em que acreditas, quando o mundo inteiro parece estar contra ti. Admiro todos os estudantes de jornalismo pela coragem de seguirem aquilo de que gostam - já venceram na vida só por isso. Acredito que podemos fazer um bom trabalho. Acredito que trazemos connosco a melhor formação possível. Acredito que temos princípios de vida e que não iremos ceder ao caminho mais fácil.
Dizem-nos que vamos diretos para o desemprego, que devíamos ter ido para engenharias ou medicina. Digo-lhes eu que o mundo não se faz só de engenheiros e médicos. Todas e cada uma das profissões existentes são importantes e merecem o seu próprio mérito. Digo-lhes que tínhamos as notas e a capacidade para entrar no curso que quiséssemos, mas esta foi a nossa escolha. Respeitem-nos por isso. Se não nos respeitarem por mais nada, ao menos por isso, por não cedermos às pressões e termos a coragem de seguir os nossos sonhos.
Dizem-nos que o jornalismo está a morrer. Eu digo-lhes que nunca esteve tão vivo. Em tempos pensou-se que a rádio, a televisão e os jornais desapareceriam para a internet ocupar o seu lugar; ainda cá estão todos. E mais fortes do que nunca, em alguns aspetos.
Não acho que tenha uma visão romantizada das coisas. Tenho 20 anos, já vi alguma coisa do mundo. E, do que vi, concluo que o jornalismo não é perfeito, tal como a sociedade não é perfeita e nós não somos perfeitos. E, se o jornalismo é feito de pessoas, só às pessoas (do entrevistado ao entrevistador, do editor ao leitor) cabe o papel de trabalhar para que seja o mais perfeito possível.
Comments