Passado, presente e futuro. Os 60 anos da RTP no Porto
- Tiago Serra Cunha
- 25 de out. de 2019
- 6 min de leitura
A 20 de outubro de 1959 era realizada a primeira transmissão produzida na íntegra no Centro de Produção do Norte da RTP, inaugurado no mesmo dia. Seis décadas depois, a estação pública assume a unidade como um dos pilares das suas emissões, com a certeza de que, mesmo já não sendo menina e moça, está mais viva do que nunca.

A 20 de outubro de 1959 era realizada a primeira transmissão produzida na íntegra no Centro de Produção do Norte da RTP, inaugurado no mesmo dia. Seis décadas depois, a estação pública assume a unidade como um dos pilares das suas emissões, com a certeza de que, mesmo já não sendo menina e moça, está mais viva do que nunca.
A prova surge nas comemorações dos 60 anos de um dos maiores centros de produção de conteúdos do país, o único desta dimensão fora da capital para uma estação generalista. A sede, em Vila Nova de Gaia, abriu portas esta quarta feira (23 de outubro) para um open day destinado a todos os que quisessem ver por dentro um dos principais motores da produção da RTP para todos os seus serviços audiovisuais, com o lançamento de um livro e a abertura de uma exposição.

Mas o que hoje se pode ver é o resultado de uma história longa e trabalhosa, num centro de produção que já teve no seu seio alguns dos mais importantes conteúdos da história da RTP, continuando este legado na atualidade, tendo em mãos grande parte da sua produção de informação e de entretenimento para televisão e rádio.
Um centro de produção com várias dimensões
Uma "grande vitória". É assim que Gonçalo Reis, Presidente do Conselho de Administração da RTP, descreve ao Ponto e Vírgula o culminar de 60 anos de produção a norte. Vitória essa que reflete a "presença consolidada, sedimentada" da marca de serviço público, que precisa "de estar em todo o território e cobrir todas as populações".
Essa proximidade dos portugueses é um dos focos principais da presença da RTP no Porto. Esta presença "aproxima a RTP dos portugueses", através da produção de conteúdos locais, com ênfase no apoio aos setores criativos da região, enriquecendo "as valências locais e regionais". No entanto, esta produção a norte não é sinónimo de produção estritamente regional. Este é, para Gonçalo Reis, um "centro de produção generalista, com competências e ambições globais".

"Ou seja, fazemos rádio, televisão, digital; fazemos informação, fazemos programas, entretenimento, documentário, co-produções internacionais. Há, portanto, uma multiplicidade de competências relevantes, que são a força do Centro de Produção do Norte [...]. Tem a ver com capacidades instaladas, que servem a RTP nas suas várias valências e desideratos".
Informação do norte para todo o país
Ao longo de várias décadas, foram desenvolvidas capacidades que são transversais aos vários canais e meios da RTP. Entre os conteúdos produzidos, destacam-se os de informação, com 40% dos conteúdos noticiosos da estação pública produzidos inteiramente a partir de Vila Nova de Gaia. Tudo começou há 18 anos com a criação da NTV, formada por jovens jornalistas e técnicos de televisão que começaram um projeto do zero, totalmente produzido no atual centro.

Destes quase 20 anos de informação com sotaque, cinco foram vividos por Diana Bouça-Nova, que chegou à informação do canal público vinda de projetos noutras áreas, de outras estações. Incumbida de acompanhar a celebração dos 60 anos a partir dos estúdios do Monte da Virgem, baixou o microfone para referir ao Ponto e Vírgula que, como jornalista e rosto da casa, é cada vez mais "essencial que o serviço público continue a ter um centro de produção com esta importância a norte do país, porque também é o único".
Único porque, apesar de existirem delegações das restantes estações na região, a RTP é o único canal generalista com uma redação polivalente e com uma abrangência conteudística alargada. Fator que aproxima a estação dos portugueses, algo que Diana sente na primeira pessoa, diariamente, e que considera a principal "missão do serviço público, da informação e da televisão" como um todo.
"Esta proximidade com as pessoas é essencial, faz com que tudo faça sentido. Porque não fazemos informação só porque gostamos; fazemos informação para as pessoas e essa deve ser acessível a todos."
Quase duas décadas depois, a NTV já foi RTPN, RTP Informação e, agora, RTP3. Algumas das caras continuam na estação até hoje, como é o caso de Cristiana Freitas, Estela Machado ou Sandra Fernandes Pereira. Mas há muitos outros rostos que deram os seus primeiros passos no canal e agora são alguns dos nomes mais sonantes do panorama informativo português.
É o caso de Júlio Magalhães, que se estreou em televisão na RTP e é atualmente diretor-geral do Porto Canal. "Os tempos são outros", mas há algo que se mantém (também) 20 anos depois da década que passou como cara da RTP; no regresso à primeira casa, recorda o "local inovador" que foi e continua a ser, com a formação de vários "talentos e profissionais".

À frente de um canal produzido regionalmente mas emitido para todo o país, ressalta que, mesmo 60 anos depois da criação deste Centro de Produção do Norte, de forma a descentralizar a produção de televisão e torná-la literalmente nacional, isto "está restringido à RTP", porque as restantes estações não têm delegações com a mesma expressão. Mesmo que se assista a alguma mudança, é mínima e "o que se fazia há 20 anos agora faz-se igual, embora com mais qualidade".
Mesmo assim, esta evolução na informação pública sente-se nos restantes canais. Mesmo com o "retrocesso" da RTP depois da aparição dos privados, em que esta deixa de dominar o mercado, Júlio Magalhães considera que a estação conseguiu aumentar o nível de qualidade das suas produções, elevando o seu estatuto como "estação de todos os portugueses", com uma programação variada e certeira.
Entretenimento de todos, para todos
Informação próxima das histórias, da população, de todo o país, mas não só. O entretenimento da RTP, pioneiro nos formatos que hoje vemos ser realizados nos canais generalistas portugueses, começou no Centro de Produção do Norte.
A 18 de setembro de 1995, era emitido o primeiro programa d'A Praça da Alegria, um dos principais formatos de daytime na televisão portuguesa, que se mantém até hoje no ar. Inicialmente apresentado por Manuel Luís Goucha e Anabela Mota Ribeiro, teve mudanças na apresentação até que, em 2002, se formou a dupla que continua à frente do programa, Jorge Gabriel e Sónia Araújo.
O apresentador, que foi um dos anfitriões da celebração dos 60 anos da RTP Porto, contou ao Ponto e Vírgula que integrar uma equipa como a esta a norte é "integrar uma família, é a sensação que se tem passado todos estes anos. Nada nos é ignorado ou afastado, tudo é muito sentido e vivido como se da nossa família se tratasse. E é essa a grande diferença da RTP Porto para a RTP em Lisboa. Aqui, nada é deixado ao acaso."
Uma proximidade interna que "nos faz perceber, no contacto que temos com os nossos convidados, que eles gostam da intimidade com que são tratados de cada vez que cá vêm, dizem que se sentem em casa", mas que, por isso mesmo, passa para fora do ecrã.

Apesar de muita da informação da RTP ser produzida nestes estúdios, o mesmo não se passa com o entretenimento. Ainda menos quando se olha para as restantes estações. Jorge Gabriel reitera que fazem falta programas de daytime produzidos noutras regiões do país, "para o país".
Dando o exemplo de artistas reconhecidos nacionalmente, ou o facto da maioria da população nacional estar concentrada acima do Tejo, considera "necessário que haja espaço para que as pessoas se dêem a conhecer, porque elas têm mérito. Muitos deles têm de ir para Lisboa para conseguir ter sucesso, mas aqui há uma oportunidade". Mesmo assim, algo começa a mudar. "Inclusivamente até o comportamento das pessoas do norte, que já sentem que aqui dispõem de espaços que são invejáveis".
"Considero que a questão essencial no caso de existir ou não um centro de produção no Porto é aquilo que é o Porto é capaz de fazer -- ou o norte, o Porto como representação. É o quanto este espaço geográfico português necessita de uma janela aberta para o mundo e é isso que acontece na Praça e nos serviços informativos."
Para o futuro, mais especificamente o da Praça da Alegria e do entretenimento, o apresentador garante que "está no caminho certo", um caminho de longa distância. "Estamos atentos ao que se passa à nossa volta, mas temos de oferecer conteúdos diferenciados dos outros canais. E essa também é a missão do serviço público, de abrir portas àqueles que se querem mostrar na Praça". O futuro do único talk-show generalista português produzido fora de Lisboa é "a inovação, o risco, atenção àqueles que não têm espaço na televisão em Portugal".
Nos bastidores da produção
Seis décadas repletas de História, que está agora resumida num livro apresentado especificamente na celebração do aniversário da RTP no Porto, fruto de uma parceria entre a estação e o Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho (UM). RTP - 60 anos no Porto é um projeto coordenado por Manuel Pinto, professor na UM, contando com sete capítulos que explicam tudo o que se viveu e produziu.

Com uma introdução de Gonçalo Reis, Presidente do Conselho de Administração da RTP, o primeiro capítulo, mais geral, foi escrito pelo coordenador do projeto; os restantes percorrem cada uma das décadas de vida da estação no Porto, contando com autores como Felisbela Lopes, Luís António Santos ou Joaquim Fidalgo.
A ideia para a obra surgiu em 2017, quando Isabel Correia, diretora do Centro de Produção da RTP Porto, idealizou um projeto para relembrar os momentos e as pessoas que fizeram parte do caminho da estação a norte.
Juntamente com o livro, surge uma exposição, que percorre as décadas de conteúdos e inovação e que poderá ser visitada durante um ano nos estúdios do Monte da Virgem, em Vila Nova de Gaia.
Fotoreportagem de Sofia Matos Silva.
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